domingo, maio 27, 2007

Shangrilá


Vez em sempre a gente se distrai. Perde contato com situações que sobrevivem à nossa displicência e espreitam num ou noutro canto. Não tem fuga, não tem deixar para depois o que pede atenção naquele agora.

Ninguém vai te perguntar se você queria pensar nisso ou naquilo, se era o melhor momento.

Serão indefinidamente trazidas ao seu conhecimento as pendências que você não cuidou de resolver consigo mesmo.

Aí então, você vai tentar. Uma, duas, dez vezes. Vai tentar da melhor forma que puder (ou às vezes, nem isso). Vai relutar em agir. Vai duvidar do que fazer. Vai perceber situações purgando sobre a superfície em chamas da sua carne.

E vai continuar sendo você mesmo e fazendo tudo (e só) o que pode fazer. Ocasionalmente, vai aprender uma ou outra boa lição, daquelas que ficam mesmo, pra sempre.

Se perceberá, direta ou indiretamente, dividindo experiências com gente que tenta avançar da mesma forma que você. Gente que quer mais da pessoa que sabe que pode ser. Gente que luta também batalhas diárias contra a incompreensão, o despreparo, as distrações, o egoísmo, a indiferença, o desconhecimento, as distâncias a percorrer no próprio íntimo.

Pensará no que já foi, antecipará o que será, celebrará o que é.

Escalará arranha-céus e repousará na rede à beira da lagoa. Cansará. Descansará até chegar o momento de vestir novamente a armadura e sair no galope de dúvidas confiantes reservado para o combate da vez.

Muito cedo vai notar que não se responde sem dor aos chamados sussurrados ou gritados aos seus ouvidos desatentos. Com o tempo vai notar também que, saber como responder aos chamados, é uma especialidade que sempre se busca e dificilmente se alcança.

E do seu jeito, mais uma vez se apresentará ao combate da forma melhor que souber. Não sem antes voltar aos questionamentos de sempre. As eternas procuras de um porquê e as reincidentes conclusões de que os porquês não lhe cabem.

O que lhe cabe, é mesmo partir. Sem mapa, sem escudeiro, sem privilégios.
Vestido apenas em entrega, a sua companhia é a coragem.

sexta-feira, maio 25, 2007

O chegar não é o fim, é apenas um descansar*


Compondo imortalidades.
Criando pedaços de gente, de luminosidade, de presentes quase invisíveis.
Construindo pontes de nos conduzir a quem queremos ser.
Planando caminhos de nos transportar a transbordantes paisagens desconexas e reais.
Sendo tudo para sermos únicos. Escolhendo batalhas, recusando propostas veladas de ser ridículos. Preferindo ser totais.
Abrindo braços, dores, entranhas e sorrisos para cada gota de existir que nos queira alcançar.
Dúvidas que cortam e doem, que não podem paralisar o desejo.
Nem sempre chegando a algum lugar visível.
Nem sempre sabendo o que oculta uma vontade.
Nem sempre compreendendo, decidindo, enxergando.
Emaranhando vidas e voando solo. Nos misturando e nos fragmentando para ser e ser até não mais poder.
Scaneando o azul e orando para sentí-lo morar dentro de nós.
Chão sagrado a conquistar.
Nem as providências práticas do dia-a-dia mecânico apagam as estrelas incontáveis que cada célula quer fazer brilhar.

*Título (e colaboração para inspiração do post) por Isti.
Outras colaborações para inspiração do post: por Edson Marques. Pelos comentários incandescentes ao post anterior. Pelas dúvidas incansáveis. Pelos momentos desta semana.

quinta-feira, maio 17, 2007

Se lhe fosse concedido um desejo

Uma pequena bússola
Para indicar que este caminho
leva mesmo pr'algum lugar. (?)

Mente desocupada, andarilha temporária
me deixa imprecisa, a questionar.
Dúvida cruel a açoitar.
Sigo nesta estrada? Há porque lutar?

Luto sem a certeza da batalha.
Sem saber onde o meu coração está.
Combatentes solitários, somos todos.
Estrelas cadentes ascendendo em busca de uma aurora.

Derrota, a sensação de seguir a esmo.
A bandeira numa chegada longíqua, a acenar.

quarta-feira, maio 09, 2007

Carta a um Anjo torto, caído, rebelde - parte ll

Já nem parece que o tempo que se foi desde o começo é tão pouco.
Já é lembrança de longe pensar na sua voz, quando a conheci. E como me confortou e me abraçou sem saber. Voz que veio para ser carinho nos meus pensamentos, nos meus sentimentos, nas minhas esperanças.
Eu, sempre muito habituada a escrever para quem se foi (ou nunca esteve), fui pega de surpresa pela vontade de escrever para o amor em tempo real. E além de escrever, ter resposta.
Você, do outro lado, falou de volta comigo. Me recebeu, me reconheceu, me respeitou. Quis saber quem eu era e me ofereceu espaço ilimitado para manter a essência, sabendo que eu não poderia viver fora dos caminhos da minha própria alma.
Como eu, você também partiu do princípio que a perfeição só serve mesmo para as cerimônias de entregas de prêmios. Para quem deseja SER, a perfeição nada significa.
Descobrimos e reafirmamos juntos, minúsculas e imensas verdades universais e particulares, acreditando que as verdades só existem no quintal de cada um. Não sobrevivem a mais de meio metro do seu criador. E você, cheio de verdades inescapáveis e mutantes, trouxe um espelho também para mim, com o meu próprio estilo de inventar o certo e o errado.
A delicadeza das suas intenções e perspectivas me deu espaço para vôo além do que eu, por mim, já possuía.
A impetuosidade dos seus quereres e sonhares, me trouxe alimento para pular do alto de um abismo invertido, sem medo de quebrar.
Pulamos da pedra, cada um no seu salto único e puro. Chamamos um ao outro para dar as mãos no salto, mesmo sem perceber. E igualmente alheios, aceitamos um chamado mútuo que ninguém na superfície deste mundo conhece como pode terminar. Ninguém na superfície deste mundo sabe se pode terminar.
Tanto a agradecer em silêncio. O cuidado de quem cultiva um bem inestimável. A percepção de quem entende que todo bem verdadeiro é poeira de estrela e deve ser reinventado a cada respirar. Não se guarda no banco. Não se poupa para amanhã. Não se registra ao portador. Apenas se vive, se ama, e se deixa acontecer tal como é, ''porque como poderia ser, jamais saberemos''.
E é tão bom admirar o balé alado deste encontro enquanto ele é vivido. Tão bom sentir as suas asas sobre a vigília e o descanso de cada dia que pretendo conquistar.
Portal de amar a vida, o seu olhar.

terça-feira, maio 08, 2007

Alívio Imediato

O que é que há de tanto a dizer, afinal?

Quem lê tanta notícia? Escritos, imagens, desenhos, colagens. Arte e gritos porque a gente precisa falar. E talvez nem use, para isso, as palavras. Sabemos que fomos arremessados aqui neste planeta imenso de tantos idiomas. Suspeito que só possa ter sido para aprender o que dizer. O que precisa ser dito e como conseguí-lo.

Abraçando idiomas que não precisam de fonteiras geográficas para existir. Idiomas que existem dentro da mesma cidade, dentro da mesma família, dentro da mesma pessoa. Códigos que pretendem ser indecifráveis e nós, a cada dia precisando decifrar. Nossos próprios códigos primeiro, quem sabe. Para tentar expressar este tanto de ser que mora dentro e quer tanto ganhar mundo. Imagens incontáveis fotografadas pela percepção. Sensações indescritíveis chupadas por cada poro. Exclamações impronunciáveis disparadas pela pulsação.

Mundos todos e tantos. Visíveis, invisíveis, imagináveis. Energias das quais somos feitos e somos testemunhas. Vibrações parceiras e conflitantes. E sentir, sentir, sentir. Um sem nome de sentires sem identificação.

Talvez a palavra seja um alívio, instrumento para sentir de dentro pra fora, tanto quanto de dentro pra dentro.

Então, damo-nos as mãos momentâneamente em cada sentir que se conecta a mais de um. E suspiramos, realizados por um segundo.

segunda-feira, maio 07, 2007

Da Janela



Logo adiante , o mar
com a noite debruçada sobre as suas ondas mornas
A lua, alta e sorridente
Acenando luz pelos contornos da areia clara.
O som quebrando a água com força, vindo e indo
festa de naturezas se saudando, se observando.
A lua, quando cansada quisesse se esconder
salivaria chuvas dos seus ombros
Expiraria trovões, piscaria relâmpagos
e suspiraria, silenciosa de ansiedade.
Ventania se deitaria, indócil
sobre pedras e caules e pétalas do lugar
Elementos vibrando em dança
ao som da entrega longe do cais.

sábado, maio 05, 2007

Em Festa



''Para que haja uma festa, basta o encontro de duas pessoas que se alegrem por este encontro'' , já disse alguém cujo nome não sei.
E assim se fazem e se comemoram os momentos maiores e melhores. Os mais simples e mais intensos.
Assim se agradece pelo que se vive.
Assim se vive em festa.