segunda-feira, maio 26, 2008

Para além das horas



Quando estávamos à beira de nossas vidas , nos dissemos verdades que nunca serão esquecidas.
Seguramos um do outro, as mãos. Sustentamos um do outro, os sonhos.
Não censuramos vontades. Não desprezamos interrogações.
De olhos vendados, saltamos o salto, beijamos o beijo, quisemos o querer, choramos a lágrima, unimos o destino.
Refletida no lago estava a imagem do mar. O mar que nos queria banhar, purificar, renovar.
Ao pousar a mão em seu peito, as batidas vieram a mim como o recuo da onda que alcançará a praia.
Uma semente temporã brotou antes da primavera para dizer que a flor menina se faria fruto.
O mel do seu sabor adoçaria meus lábios e ares.
A dança se faria som, céu, sim.
Dois corpos chicoteando palavras e silêncios.
Aportamos no cais ao final de uma tarde colorida. O céu, em brasa por nossas vidas.
À chegada do novo dia, navegamos, fluindo entre mergulhos e lânguidas braçadas que nos afastavam da costa.
Nascemos.
Na busca pelo caminho que haveríamos de trilhar, socorremos dores e gestos quebrados com o tempo.
Pousou a ave aprendiz. Abraçou com as asas, o encontro.
Nos verdes campos fez ninhos de coragem.
Parceira da brisa que lhe doou movimento ao vôo.
Viajando por novas cidades, escolhemos a morada onde nossa comunhão arquitetou seu habitar.
Passam as cidades. Passam os países. Passam povos indecifrados.
Ressoam alto os novos idiomas que aprenderemos.
Ensinamos outras canções para que as celebrações façam aplausos como se fosse filhos.
Encantamos nossas retinas, cansadas do mundo repreendedor.
Um para o outro, encandescemos em desafio acalentador.
Poeticamente, como o desejo de cruzar a ponte sobre os girassóis que ascendem o caminho.
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terça-feira, maio 20, 2008

Os Alquimistas



Desde sempre sonhei em realizar grandes feitos. Mesmo sem saber o que estes grandes feitos seriam, ou em que área, ou como.
Constantemente naquele misto de expectativa/intuição de que algo muito maior e melhor estaria por vir.
Não está destinado a todos descobrir a cura da Aids, fazer um excepcional trabalho humanitário através da Organização das Nações Unidas, produzir incomparáveis obras de arte ou mesmo motivar milhares de pessoas a buscar maior qualidade em suas vidas. Mas ainda acredito nos grandes feitos predestinados, para todos.


Quem sabe onde as nossas escolhas irão nos levar e de onde irão nos trazer? Creio que os grandes realizadores, os que deixam suas vidas marcadas na História, muito possivelmente estavam apenas sendo eles mesmos em seu trabalho e em seu dia-a-dia, quando a semente de algo que vinha sendo cultivado brotou muito expressivamente e ficou. E o que identifica um "grande feito" é o seu alcance. Aquele que vai positivamente em direção a muitas outras vidas e, nelas, opera algo de bom.

Se tornou perceptível para mim, claramente, que é muito possível (e provável) também que todas as pessoas, de alguma forma, realizem os seus grandes feitos particulares. Aparentemente, em menor escala. O alcance talvez seja outro. Mas o lema "pense globalmente, aja localmente", eternizado pelo Green Peace aponta a viabilidade deste caminho tão válido. De verdade, é impossível medir o alcance de uma atitude, de uma palavra, de um gesto. E estes sempre ecoam. Para além de nós, de maneiras que talvez nós nem venhamos a saber.


Se tornou perceptível também que há tipos e tipos de feitos. Feitos para os quais não seja preciso sequer se deslocar. Em casa, entre amigos, no trabalho. Uma palavra na hora certa que é capaz dar novo ânimo à vida de alguém. Um exemplo que vem como lição para um amigo ou colega ao lado. Um abraço sincero no momento exato, que deixa claro que o outro não estará sozinho.


Momentos cruciais que acontecem todo dia. Encruzilhadas cotidianas que definem se escolheremos o caminho da esquerda, o caminho da direita, o retorno, o não-caminhar. E com estas definições se faz uma vida.
Com estes laços, se amarra a maior de todas as conquistas, a conquista de ter feito diferença, em algum momento, para alguém.


É um tipo de poder individual responsável por muitas das escolhas acertadas do nosso semelhante. Um passo simples para uma alquimia coletiva gerando pessoas maiores.
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segunda-feira, maio 12, 2008

Um Pensamento Incompleto



É uma época interessante para se estar vivo.

Consequências explodindo no Globo, apatia guiando vidas, crimes atrozes dividindo as manchetes com a esterilidade do mundo da fama e a corrupção inerente ao mundo do poder. Paralelamente, Ongs e grupos agindo em favor da raça humana sem esperar que chefes de estado e representantes políticos façam todo o trabalho, iniciativas para mudança de hábitos e costumes em favor da preservação deste planeta e da qualidade de suas vidas, solidariedade e comoção diante de vidas que se perdem gratuitamente.

É quase uma dança de frequências conflitantes (ou complementares?). As forças naturais, tanto do planeta quanto do ser humano, trazendo à tona emoções latentes preparadas ao molho da prepotência e da indiferença sofridas. Os esforços individuais correndo contra o tempo para reconstruir ou preservar algo de essencial para a vida coletiva, junto à descoberta de que o individual só existe plenamente na coletividade.

Um caldeirão fervilhante e, quero crer, evolutivo.

Incomparáveis avanços tecnológicos ao lado de mentes irreversivelmente estreitas.
Soluções perpetuamente empacadas ao lado de demonstrações inimagináveis da grandeza do homem.

Uma época onde quase tudo é possível para um momento onde muito é deixado para depois.

Não vejo grande diferença na violência, na corrupção ou no descaso de tempos atrás. Mas me parece que há uma considerável parcela da humanidade que não demonstra grande interesse ou emoção por este nosso tempo. Como se ele não fosse nosso, como se fosse igual a um outro tempo qualquer, como se a vida, tal como a conhecemos, fosse se repetir ou durar eternamente.

Engano.

Estas são as nossas lutas. Esta é a nossa Era. Estas são as nossas dores e deleites. E sim, pertencem a nós, apenas. Ninguém mais as virá resolver.

E como ser uma gota em meio a este oceano revolto? Vejo que, de nada serviremos a nós mesmos, submergidos em névoa e sombra. Para nosso próprio mundo interno é preciso trazer a luz, a conscientização.
Consciência dos próprios eus, da necessidade absoluta de nos livrarmos dos conceitos que nos foram, simplesmente entregues por outras gerações que não cresceram na nossa realidade. Por gerações que viveram outros processos de evolução, em cenários de outros formatos e conteúdos.

Não nos servirá a nada repassar pré-conceitos sem analisar e compreender o período ao qual nos foi oferecida participação. Único. Compelido por questionamentos que partem de porquês diferenciados dos questionamentos já feitos em tempos idos.

O poder ficará obsoleto. A tradição ficará obsoleta. A indiferença ficará obsoleta.

Será exigido, já tendo passado o tempo de pedir, que cada pessoa sobre a Terra faça parte e faça a sua parte. Iguais. Imprescindíveis. Renovados.

Reciclaremos a natureza e as nossas mentes diante desta única alternativa.


Não penso em quais foram as condições nas quais recebemos o mundo de nossos pais. Penso apenas em quais serão as condições nas quais entregaremos o mundo aos nossos filhos.
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