terça-feira, setembro 30, 2008

Ubuntu

Outro dia, eu aprendi o que significa ubuntu.
É uma palavra n'algum dialeto africano cuja tradução não é exata, nem breve como a sua origem. Para explicá-la , é preciso contar uma história.

No período pós-apartheid (que teve seu final em 1994), foi criada na África, a Comissão da Verdade e Reconciliação, iniciada por Nelson Mandela e seus líderes. Esta comissão constituía basicamente na anistia aos criminosos do Apartheid, desde que, estes assumissem a autoria dos crimes, podendo provar que foram cometidos sob ordens superiores, e desde que, suas vítimas (ou, em sua maioria, a família delas) tivessem a oportunidade de confrontá-los e contar suas histórias. Contar, diante da comissão e demais presentes, como eles mesmos, ou seus filhos, maridos, irmãos, foram torturados ou mortos, ou ambos, pelos respectivos algozes durante o sangrento período.
Uma das vítimas que ficou viva para contar sua própria história - Sr. Anderson, este sereno senhor de idade um pouco mais avançada - pediu, em audiência, ao policial agressor que lhe disse porquê invadiu sua casa, o agrediu, destruiu o local e as àrvores que ali estavam plantadas, e lhe provinham alimento. Pediu que lhe dissesse o porquê, para que pudesse perdoá-lo.
Ao final da audiência, Sr. Anderson, quando parabenizado por um jornalista norte-americano que fazia a cobertura do evento, por haver "mostrado a eles", cândidamente explicou que sim, havia mostrado a eles o que era ubuntu. "Fazemos parte um do outro. Quando um policial me fere, ele machuca a você também. Fere a todas as pessoas neste mundo, e fere também a ele mesmo. Nelson Mandela nos ensinou isso. "
Diante do olhar surpreso do jornalista, Sr. Anderson ainda continuou, pedindo a ele que contasse aos americanos esta verdade que havia aprendido na África do Sul, e oferecendo a ele seu próprio cajado como símbolo de que "não estamos sós neste mundo".

Se eu tivesse de resumir "ubuntu", ficaria com a primeira frase dita ao repórter: fazemos parte um do outro. Um fio invísivel, e inquebrável, nos liga a todos. O que dói em mim, dói em você também, e a minha felicidade, é também a sua.
Sabendo disto, o Universo frequentemente nos prega algumas perversas peças cósmicas. Enquanto alguém comemora o aniversário de uma pessoa amada, alguém chora a ida prematura de um filho , ainda bebê. Enquanto alguém vibra com uma esperada gravidez, cercada de sonhos, alguém quebra com a perda de um grande amor. Uns celebrando a renovação da vida, outros suportando suas mortes.
Entre um extremo e outro, ficam os demais que estão, neste momento, experimentando a infinitude de "pequenas" tragédias e "pequenos" êxtases que se pode experimentar. Dores indizíveis e plenitudes silenciosas que cercam todos os nossos dias.
É palpável como um corte feito a faca. Como chuva caindo em solo árido.
Uma única moeda, contínua, com dois lados opostos e complementares. Os dados são lançados e, nesta rodada, é hora de rir. Ou chorar.
Não que nossas preciosas vidas sejam obra de sorte ou azar. São obras de nós mesmos, mas são também uma congruência imponderável e incessante. Sempre oposta, sempre complementar, sempre una.


"Eu vi um menino correndo,

eu vi o tempo

brincando ao redor do caminho daquele menino

Eu pus os meus pés no riacho

e acho que nunca os tirei

o sol ainda brilha na estrada e eu nunca passei."

[Força Estranha, de Caetano Veloso]


4 comentários:

Anônimo disse...

Aorei o significado de "Ubuntu" muito legal mesmo, então te digo:

Ubuntu e Namastê.

Anônimo disse...

Sorry...ADOREI

Anônimo disse...

Bia, amei esta postagem tua! Extrema sensibilidade para falar de um assunto tão profundo quanto este da interligação universal. Sabemos que as nossas ações possuem repercussões cósmicas, por isso devemos ser extremamente criteriosos e responsáveis pela influência que exercemos quando promovemos situações, utilizamos da palavra, ou praticamos ações que bem sabemos, irão afetar a vida de outras pessoas, pois "fazemos parte um do outro" como bem define o "ubuntu".

Esta música Força Estranha, do nosso querido Caetano Veloso, principalmente interpretada pela Gal Costa, é uma pérola da nossa MPB.

Te deixo, minha linda, o sorriso de um anjo azul brincando numa rosa branca, para enfeitar o teu dia. Também fica um beijo no coração, com meu carinho.

Anônimo disse...

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Entre beijos e abraços, bolo com guaraná eu recebia os presentes. Uns se davam como lembrança e outros traziam algo a mais, como você. Obrigado por ter vindo e comentado nequela página.

silvioafonso.






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