sexta-feira, setembro 12, 2008

Poeminha para uma prosa

O casamento é permanente, o namoro é provisório. O amor é permanente, a paixão é provisória. Uma profissão é permanente, um emprego é provisório. Um endereço é permanente, uma estada é provisória. A arte é permanente, a tendência é provisória. De acordo? Nem eu.

Um casamento que dura 20 anos é provisório. Não somos repetições de nós mesmos, a cada instante somos surpreendidos por novos pensamentos que nos chegam através da leitura, do cinema, da meditação. O que eu fui ontem, anteontem, já é memória. Escada vencida degrau por degrau, mas o que eu sou neste momento é o que conta, minhas decisões valem pra agora, hoje é o meu dia, nenhum outro.
Amor permanente... como a gente se agarra nesta ilusão. Pois se nem o amor pela gente mesmo resiste tanto tempo sem umas reavaliações. Por isso nos transformamos, temos sede de aprender, de nos melhorar, de deixar pra trás nossos imensuráveis erros, nossos achaques, nossos preconceitos, tudo o que fizemos achando que era certo e hoje condenamos. O amor se infiltra dentro da nós, mas seguem todos em movimento: você, o amor da sua vida e o que vocês sentem. Tudo pulsando independentemente, e passíveis de se desgarrar um do outro.

Um endereço não é pra sempre, uma profissão pode ser jogada pela janela, a amizade é fortíssima até encontrar uma desilusão ainda mais forte, a arte passa por ciclos, e se tudo isso é soberano e tem valor supremo, é porque hoje acreditamos nisso, hoje somos superiores ao passado e ao futuro, agora é que nossa crença se estabiliza, a necessidade se manifesta, a vontade se impõe – até que o tempo vire.

Faço menos planos e cultivo menos recordações. Não guardo muitos papéis, nem adianto muito o serviço. Movimento-me num espaço cujo tamanho me serve, alcanço seus limites com as mãos, é nele que me instalo e vivo com a integridade possível. Canso menos, me divirto mais, e não perco a fé por constatar o óbvio: tudo é provisório, inclusive nós.

[Martha Medeiros]


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Quando da instalação da mudança
Abracei o que desconhecia,
com uma das mãos
atada à familiar segurança

Olhos se desprendem devagar
hão de viajar outras paragens
Saem lentamente, voltam de repente
Assuntam e pescam no ar

A poluição irrita os novos olhares
a incerteza lacrimeja
Mas há o respiro,
há a paz de não saber

Quando do clarear do dia
pernas inquietas sacolejam suposições
Andarilha indo, voltando
nascente indefectivelmente cativa

Os anjos todos soltos nas esquinas
bocas que se abrem para dizer o bem
bocas que se abrem para fazer o mal
anjos de asas, ou de chifres

Ouvi o mundo trocar seu lugar
o mudo, o cego, o surdo pedido
Espetáculo raro de provar
Sequer a mim confirmar.

4 comentários:

Sanka disse...

A senhorita tem estado encantada com martha medeiros, né?
também... não é por menos.

Bom gosto também é provisório?

rs.

beijos!!!!

Bianca Helena disse...

Quase nem se nota...hihihihihi

Anônimo disse...

O texto da Martha é ótimo! Mas o seu poema mexe com a nossa dificuldade de aceitar as mudanças. Mesmo as sabendo necessárias, quase sempre!
Excelente tb o texto anterior. Intimista e ao mesmo tempo uma cutucada para a reflexão!
Beijos moça!

Lidiane disse...

Menina querida.
E não é a vida provisória?
Hum?

Beijo, beijo pra você.