segunda-feira, outubro 23, 2006

A porta escrito "não consigo"

Encontrei um livreto de bolso do Rubem Alves (Se eu pudesse viver minha vida novamente) que reúne alguns pequenos textos que nos trazem um tipo de sabedoria que apenas ele e mais alguns poucos poderiam. Logo de início, nos deparamos com um texto a partir do título que vem na sequência do poema de mesmo nome atribuído tanto a Jorge Luis Borges quanto a Nadine Stair (aquele onde ele diz que "trataria de cometer mais erros, não tentaria ser tão perfeito" e segue citando todas as precauções que não teria e de que forma aproveitaria mais e melhor seu tempo, lindo!). Rubem faz, digamos, a sua própria versão do que faria se pudesse viver sua vida novamente, a qual muito me emocionou e tenha sido talvez a razão pela qual o livreto me caiu nas mãos . Diz assim:
"Se eu pudesse viver minha vida novamente, eu quereria vivê-la do jeito mesmo como a vivi, com seus desenganos, fracassos e equívocos. Doidice? Imaginem que eu estivesse infeliz. Eu teria então todas as razões para voltar atrás e tentar consertar os lugares onde errei. Mas eu não estou infeliz. Vivo um crepúsculo bonito, com a suíte número 1 de Bach, para violoncelo. Se houve sofrimentos no caminho, imagino que, se não os tivesse tido, talvez a suíte número 1 de Bach não estivesse sendo ouvida. Estou onde estou pelos caminhos e descaminhos que percorri.
Eu estou onde estou porque todos os meus planos deram errado. Isso é absolutamente verdadeiro. As pontes que construí para chegar aonde eu queria ruíram uma após a outra. Fui então obrigado a procurar caminhos não pensados. E aconteceu, por vezes, que nem mesmo segui, por vontade própria, os caminhos alternativos à minha frente. Escorreguei. A vida me empurrou. Fui literalmente obrigado a fazer o que não queria.
Sofri a dor da solidão e da rejeição. Mas foi esse espaço de solidão na minha alma que me fez pensar coisas que de outra forma eu não teria pensado.
Plantei árvores, tive filhos, escrevi livros, tenho muitos amigos e, sobretudo, gosto de brincar. Que mais posso desejar? Se eu pudesse viver a minha vida novamente, eu a viveria como a vivi porque estou feliz onde estou."
Mais adiante, no final de outro texto, completa: "Porque a vida é bela a despeito de tudo. 'A despeito de': é aí que moram os deuses. E os poetas".
E são tantos outros momentos assim, desta beleza contundente, que eu poderia tranquilamente citar o livro todo que, apesar de pequenino, contém grandes verdades sobre sentir, ver e viver a vida atavés deste olhar que nos lembra porque estamos vivos. São raros estes momentos, onde decidimos lembrar. São raros os momentos onde conseguimos parar tudo o que fazemos que não nos levará a nenhum dos lugares onde queremos chegar, e lembrar com a alma porque é que acreditamos estar aqui.
Em mim, por muitas vezes bate a vontade de passar uma borracha em tudo que ficou para trás e começar fresca, do zero. Muitas vezes bate a sensação de ter feito tudo errado - sensação tanto enganadora quanto injusta comigo e com as minhas próprias decisões, diga-se de passagem.
Ocorre que a vida pede para ser assumida e são tantos e tão diversos os caminhos, que às vezes me assola a estranha sensação de não haver verdadeiramente assumido nenhum. De haver apenas ficado em cima de um muro cósmico esperando que algum fator sobre-humano me derrubasse para o melhor lado. Isto não é algo tão inseguro e fraco quanto possa soar à primeira vista. Veja que, entre o início de tudo e hoje, vieram muitas e muitas escolhas e decisões - até porque eu sou do tipo incapaz de permitir que alguém decida qualquer coisa por mim - mas o que me mata é nunca ter conseguido ter certeza de uma escolha certa. Eu também, como o Rubem, estou no time daqueles que andaram muito mais na vida através dos "planos" que deram errado. Ou daquilo que imaginei, já que tenho a mesma dificuldade em fazer planos que tenho em estar certa do caminho a escolher. Me parece que o movimento da vida é por demais avassalador e pontuado de senões e desvios sobre os quais não sabemos para que se afirme qualquer coisa com tanta certeza assim. O imponderável sempre se apresentou a mim como um personagem por demais determinante para ser ignorado. Aguardo que o imponderável escolha, então? De forma alguma. Sua força existe, porém. E de tempos em tempos se instala em nossas vidas como que querendo nos turvar - ou limpar - a visão e os outros sentidos.
Fico eu - e o Rubem - tentando me safar do nevoeiro/chuvisqueiro, com as parcas certezas e as dúvidas cintilantes.

2 comentários:

Anônimo disse...

Queridona!
Muito lindo teu post, tua reflexão.
Me fez viajar no passado também, no que vivi, no que quero viver e na vontade absurda de sempre valer à pena.
Mas posso dizer do hoje e sou muito grata por tudo!
Beijos!!

Anônimo disse...

oLÁ QUERIDA BIA.TUDO EM PAZ?PASSANDO PARA MATAR SAUDADES(OS VIVOS SEMPRE APARECEM!)RS...aMIGA,VENHO INFORMAR QUE O BLOG ANARKISTA ESTRÁ ENCERRANDO DE VEZ O SEU ESPAÇO(JÁ CUMPRIU BEM A SUA TAREFA),TALVEZ EU FAÇA UMA NOVA SALA COM NOVIDADES(QUE SAO MUITAS).nOVA INTERAÇAO,E VISUAL.qUERO AGRADECER O TEMPO QUE VOCE LÁ ESTEVE,DANDO A MIOR FORÇA,INTERAGINDO.fORAM MOMENTOS ÓTIMOS.sEMPRE QUE POSSÍVEL PSSAREI POR AQUI PARA UM ALÔ SAUDOSO.BIA,AINDA BEM QUE VOCE DEIXOU A ANTIGA CASA SENAO NAO TE ACHARIA E NEM AO AMIGO JOSÉ.dESEJO-LHE MUITA PAZ..BEIJOS.IZY VORS.