Observo-me cuidadosamente sem sequer me olhar.
Venho de vindas e idas, de idas sem vindas, de voltas, revoltas, partidas.
Mulher tem este jeito de se conferir, parece. Anotar ali no caderninho todos os seus pontos contra e a favor. Somar-se, subtraír-se, traír-se, sabotar-se, aplaudir-se. E de suas anotações, não se esquece jamais.
Não sei como é que funcionam todas as outras mulheres, embora tenha um bom parâmetro nas mulheres incríveis que conheço. Eu, porém, preciso ser cada dia mais minha. Sabe como é?
Você acorda de manhã, sem absolutamente nenhum aparente motivo para sentir mais ou melhor qualquer traço de existência que seja. Num giro de pescoço, voilá! Nota, a partir do nada que está tão bem para uma você... Nota que, mesmo que pudesse estar muito melhor, poderia também estar tão abaixo de si mesma em tanta coisa e no entanto esta aí: toda sua.
Travou suas batalhas e sabe que guerreará até o último dos seus dias de uma forma ou de outra. Chorou os seus medos, muitos do quais suspeita que não conseguirá se livrar. Ovacionou suas conquistas, ainda que silenciosamente, no íntimo dos seus pulsares. Ergueu-se pensando não poder ir nada além. Caiu, quando finalmente tudo parecia estar tão certo.
Estarreceu-se. Completa e profundamente, estarreceu-se com o que há de pior no ruim. Descobriu pequenezas e mesquinharias que sequer imaginava algum dia presenciar. Encontrou pedregulhos e montanhas no meio do caminho. Fez nascer asas. Não só aprendeu a nadar, mas foi contra a corrente dos pasteurizados.
Ser sua suprimiu quase sempre até as maiores carências. E até essas te fizeram sua como você só. Sempre que quis ou precisou do que quer que estivesse ausente, conseguiu um tempo de olhar um pouco mais pra dentro ou um tanto mais pra fora...mas, olhar. E viu, soube, percebeu. Verdades tantas de um interior. Jornadas fantásticas de saber-se e de ter-se. E a carência é tão necessária também. "Qualquer coisa que chora, qualquer coisa que sente saudade..."
Esta sensação doída e revolta de despedaçar o casulo. E sempre solta para cada novo abrir de casulo.
O que muda da mulher-menina que um dia fui para a guerreira-feiticeira que um dia quero ser, eu não sei. Mas elas são lados idênticos da batalhadora que sou hoje. Luto lutas erradas também. Muitas. Em tantas vezes o combate não parece bom. No entanto surgirão sempre novos combates, tenazes, confusos, vãos. Nada disso me importa, nada disso afugenta quem eu sou ('sou' do que já sou e do que talvez nunca seja).
Observo as imperfeições que são tão eu. Me sinto em cada palmo de pele exposta, em cada tremer de cílios, em cada vontade de me surpreender um pouco mais comigo.
4 comentários:
Poxa!! Esta mulher é minha amiga!! Que texto maravilhoso, tão bem escrito, verdadeiramente lindo, completo!!! Ahhhhh ótimo!!!
E esta imagem... que saudades do Aquiles!!! Grande beijo, Flor, com o desejo de muitas batalhas e conquistas, além de tudo, e com tudo, viver!!!
Quero ser minha
Pra poder ser sua
Quero nunca mais partir
Pra longe de mim
Vem, alivia, adianta, adivinha
Quero ser sua
Pra poder ser minha
("Espelho Seu", Elisa Lucinda)
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Amei o texto... Você nele.
Beijo, linda.
Como assim, cara pálida...num giro de pescoço!!!!Isso dá a impressão de ser um curtíssimo espaço de tempo. Até onde eu sei, do momento que voce (corpo) acorda até aquele em que vc (espirito)também desperta,passam-se pelo menos...2 dias!!
Agora, falando sério, quando leio seus textos,tenho a exata impressão de estar diante de um vulcão prestes a entrar em erupção.Simplesmente lindo!
Te amo!
Lucia
Nossa!!Como lembro de mim em algumas frases.Em grau de dificuldades talvez um pouco diferente.Como se minhas mãos entrelaçadas e não sei o que delas fazer.
Querendo pousar os meus olhos em qualquer lugar e fazer algo diferente... Porque as vezes nada quero modificar...
Somente a mim!...talvez não mais.
E tenho me procurado...
e às vezes me deito só, com vista para mim.
Admiro quem sou...Mas é carnaval... e alguns blocos passam...rsrsrs Bia!! Que seu feriado seja maravilindo tb. Bjs.*
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